“Haverá Eleições” – 1975: As Primeiras Eleições Livres em Portugal

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Após as primeiras eleições nas quais votei em toda a minha vida, decidi ir a uma exposição sobre as primeiras eleições livres em Portugal. Localizada na Fundação Calouste Gulbenkian, esta foi organizada no âmbito das Comemorações dos 50 anos do 25 de abril. Reúne um vasto material que retrata o período intenso vivido antes, durante e após as eleições de 25 de Abril de 1975.

Encontra-se aberta a visitas, sem qualquer custo de entrada, desde 8 de Setembro, e estará até dia 31 de Outubro. Aconselho vivamente a aprender sobre este tema tão importante: as eleições e a crescente liberdade do nosso país.

A exposição inicia com o painel de dez pequenos monitores, e em cinco deles podemos observar alguns vídeos numa ordem estratégica de informação, com fones para ouvirmos o áudio dos vídeos. Esta primeira parte está dividida em dois momentos cruciais do tema da exposição: antes de 1975 e depois de 1975. Cada um dos momentos tem alguns vídeos importantes, que marcam a sua essência.

1. Eleições para a Assembleia Nacional. Votações de Américo Tomás e António de Oliveira Salazar – 1966

Fonte: Soraia Amaral

As eleições para a Assembleia Nacional de 1966 ocorreram durante o regime do Estado Novo, liderado por António de Oliveira Salazar. Estas, como todos sabem, não foram eleições livres, pois o único partido permitido era a União Nacional, que venceu todos os lugares, claro. Salazar e o presidente Américo Tomás votaram simbolicamente, num ato usado pela propaganda para mostrar apoio ao regime, não havendo qualquer liberdade democrática presente.

2. Festa dos Aventais em Lisboa – 1957

Fonte: Soraia Amaral

Este evento simbólico reunia mulheres da Mocidade Portuguesa Feminina e outras organizações ligadas ao regime, que usavam aventais brancos como símbolo de trabalho, pureza e dedicação à família e à pátria. A festa tinha um forte caráter de propaganda, exaltando os valores tradicionais defendidos por Salazar, como a moral, o lar e o papel da mulher na sociedade.

3. Concurso Mulher Ideal Portuguesa – 1973

Fonte: Soraia Amaral

O concurso destacava qualidades como dedicação à família, moral, modéstia e espírito patriótico, em vez de beleza física ou independência feminina. Serviu como instrumento de propaganda, reforçando o papel da mulher como esposa, mãe e guardiã dos valores nacionais, ainda que num momento em que o regime já se encontrava em declínio.

4. Programa do Movimento das Forças Armadas. Excerto sobre a Guerra Colonial – 1974

Fonte: Soraia Amaral

O documento reconhecia que a guerra era injusta e insustentável, propondo uma solução política e negociada para alcançar a paz, promovendo o fim da Guerra Colonial. Este ponto marcou uma rutura com o regime de Salazar e Caetano, que insistira em manter o império colonial.

5. Povo que Canta II – 1972

Fonte: Soraia Amaral

O projeto, coordenado por Michel Giacometti e Fernando Lopes Graça, tinha como objetivo preservar e divulgar o património musical do povo português, recolhendo canções e tradições rurais. Foi transmitido ainda durante o Estado Novo, e destacava a autenticidade e riqueza cultural do povo, contrastando com a visão oficial e urbana promovida pelo regime.

6. Desfile etnográfico em Vila Verde – 1968

Fonte: Soraia Amaral

O evento cultural que apresentou trajes, danças e tradições populares portuguesas serviu para exaltar o folclore e a identidade rural como símbolos da “portugalidade”. Embora valorizasse a cultura popular, o desfile tinha também um caráter de propaganda, mas mais revolucionário, reforçando a imagem de um país tradicional e unido sob o regime.

7. Banquete em honra de Dom José da Costa Nunes – 1967

Fonte: Soraia Amaral

Foi uma cerimónia de homenagem ao cardeal português, com a presença de autoridades do Estado Novo. O evento teve como símbolo a aliança entre o regime de Salazar e a Igreja Católica, destacando a importância da religião na legitimação do poder político.

8. Missa pela Inauguração da Ponte Salazar – 1966

Fonte: Soraia Amaral

Marcou a abertura da ponte sobre o Tejo, reconhecida nos dias de hoje como Ponte 25 de Abril. A cerimónia religiosa contou com a presença de António de Oliveira Salazar e outras autoridades, simbolizando a união entre o Estado e a Igreja. A missa e o evento foram usados como propaganda do regime, exaltando o progresso e a liderança de Salazar.

9. Velório de António de Oliveira Salazar

Fonte: Soraia Amaral

Marcou a morte do líder do Estado Novo após mais de 36 anos no poder. A cerimónia contou com grande aparato oficial, homenagens de autoridades portuguesas e estrangeiras, e cobertura mediática controlada pelo regime. O velório serviu para reforçar a imagem de Salazar como figura central e incontestável da nação, consolidando seu legado político e ideológico.

Fonte: Soraia Amaral

Assim, dá-se o “início do fim da censura”, prometendo as gloriosas e futuras Eleições Livres.

1. Manifestação do 1º de Maio de 1974 – 1974

Fonte: Soraia Amaral

Realizada poucos dias após a Revolução do 25 de Abril, foi a primeira grande celebração do Dia do Trabalhador em liberdade em Portugal. Milhares de pessoas participaram, expressando reivindicações sociais, políticas e laborais. O evento simbolizou a libertação da opressão do Estado Novo e o início de um período de democratização e conquista de direitos.

2. Discurso de Salgueiro Maia – 1974

Fonte: Soraia Amaral

Este discurso destacou-se pela mensagem de calma e ordem, transmitida à população e às forças militares. Ele reforçou a importância da democracia, da unidade nacional e do fim da repressão do Estado Novo, assegurando que a transição seria pacífica. O discurso consolidou Maia como figura central da Revolução, transmitindo confiança e legitimidade ao Movimento das Forças Armadas (MFA).

3. A Cultura em Portugal – 1974

Fonte: Soraia Amaral

Refere-se ao período imediatamente após a Revolução do 25 de Abril, marcado por mudanças significativas na cultura do país, a chamada renovação cultural. Com o fim da censura e da repressão do Estado Novo, surgiram novas liberdades de expressão artística e intelectual, permitindo a divulgação de livros, música, teatro e imprensa antes proibidos.

4. Cooperativa Agrícola Torre Bela – 1975

Fonte: Soraia Amaral

Os trabalhadores agrícolas tomaram posse das terras e organizaram a produção coletivamente, sem hierarquia tradicional de proprietários. O projeto simbolizou as expectativas de transformação social e justiça rural durante o Processo Revolucionário em Curso, tornando-se um marco da luta pela terra e pelos direitos dos trabalhadores.

5. Comemorações do Dia Internacional da Mulher em Lisboa – 1975

Fonte: Soraia Amaral

O evento destacou direitos das mulheres, igualdade de género e participação política, reunindo associações femininas, sindicatos e movimentos sociais. Representou um marco na visibilidade das mulheres na sociedade portuguesa, refletindo as mudanças trazidas pelo processo democrático e pela luta pelos direitos civis e sociais.

6. Perfil: Maria Velho da Costa – 1978

Fonte: Soraia Amaral

Reconhecida pelo seu envolvimento com o Grupo da Oficina e o Movimento Feminista, Maria abordava em suas obras temas como identidade, gênero e crítica social. O destaque de 1978 refletiu o interesse crescente pela literatura de contestação e pela voz feminina na Portugal pós-revolução.

7. Liberdade é nome de Mulher (Maria Antónia Palla) – 1975

Fonte: Soraia Amaral

Produzido logo após a Revolução de 25 de Abril, este documentário emblemático abordava temas como direitos civis, participação política, trabalho e igualdade de género. O filme simbolizou a emergência da voz feminina na sociedade portuguesa e o impacto da liberdade conquistada com o fim do Estado Novo.

8. Abertura solene da Assembleia Constituinte – 1975

Fonte: Soraia Amaral

Marcou o início do processo de elaboração da Constituição da República Portuguesa após a Revolução de 25 de Abril. Contou com a presença de representantes eleitos democraticamente, simbolizando a transição para a democracia e o fim do regime autoritário, tendo sido um momento histórico que deu início à institucionalização dos direitos, liberdades e garantias fundamentais em Portugal.

Fonte: Soraia Amaral

Para finalizar esta parte da exposição, é interessante destacar a frase que o os painéis mostram: “Nunca mais Fascismo”

Isto coloca um ponto final à censura, à opressão, à ausência de liberdade, ao desrespeito dos direitos humanos, à escuridão vivida por um povo. Um povo que, ao erguer as suas vozes, foi capaz de pôr fim a tudo isso, e de dar início ao que, nos dias de hoje, damos quase como garantido. Graças ao povo do 25 de Abril de 1974, hoje somos livres, simplesmente livres, e esperemos que esta frase seja sempre respeitada.

A restante exposição é mais detalhada, contando com informações acerca de “Quem podia Votar?”, “O Partido Único”, “Tão Livres como na Livre Inglaterra”, “Um Jogo Viciado”, “A Candidatura de Norton de Matos”, “O General sem Medo”, “Esperança Frustrada”, “A Promessa das Eleições”, “Concretizar o Prometido”, “Haverá Eleições?”, “Os Partidos e a Campanha”, “O Dia do Voto”, entre outros.

Algo que quero destacar, é a última sala da exposição, a qual contém diversas informações acerca das Primeiras Eleições Livres. Algo mais próximo de nós, que já demonstra uma democracia livre, algo com que nos conseguimos relacionar.

Especial Eleições: Assembleia Constituinte – 1975

Fonte: Soraia Amaral

As Eleições para a Assembleia Constituinte ocorreram dia 25 de Abril de 1975, um ano após a Revolução dos Cravos, com o objetivo de criar uma nova Constituição democrática. A sua função foi redigir a Constituição da República Portuguesa, aprovada em 1976.

Os principais partidos eleitos foram o PS, PPD (atual PSD) e PCP.

O mais chocante é a maneira como as pessoas votam. Sendo a primeira vez, grande maioria não sabe o que é votar, em quem vota ou para que serve o voto. Muitos não sabem de que se trata a Assembleia Constituinte. Muitos até nem ler e escrever sabem.

Terá ganho o PS, tendo tido o PPD uma grande repercussão, o que deixou os atores políticos esquerdistas bastante desiludidos.

Fonte: Soraia Amaral

“Achava que não me ia interessar tanto pela exposição, muito honestamente, mas sinto que aprendi muito acerca de assuntos extremamente importantes para o mundo em que vivemos.” – Afonso Brandão

Este artigo de opinião é da pura responsabilidade da autora, não representando as posições do desacordo ou dos seus afiliados.

Fonte da imagem da capa: Fundação Calouste Gulbenkian

Escrito por: Soraia Amaral

Editado por: Rodrigo Caeiro

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