A comunicação social sintonizou e, mais uma vez, caiu de joelhos aos pés do partido mais populista do nosso país na atualidade. Vejamos as parangonas desta última semana:
“Proibição de burcas em espaço público. O tipo de véu, as multas e as exceções no projeto de lei do CHEGA que o Parlamento aprovou”
Fonte: Diário de Notícias
“Parlamento aprova proibição do uso de burcas em espaços públicos”
Fonte: SIC Notícias
“Agora não se pode usar burca em Portugal. Mas pode-se usar cachecol? E um capacete?”
Fonte: CNN Portugal
“Parlamento aprova proibição da burca em espaços públicos”
Fonte: Expresso
Ninguém diria, mas em nenhum momento, no projeto de Lei n.º47/XVI/1.º aprovado pela Assembleia da República no passado dia 17 de outubro, é mencionada a palavra “burca”.
Sim, a lei “proíbe a ocultação do rosto em espaços públicos, salvo determinadas exceções”. Por outras palavras, proíbe a utilização de qualquer tipo de vestuário que impeça a identificação da pessoa, contemplando ainda exceções: motivos de saúde ou profissionais, artísticos e de entretenimento ou publicidade, razões relacionadas com a segurança e condições climáticas, e espaços como aviões ou instalações diplomáticas e consulares.
A palavra “burca” surge apenas quando, para fundamentar a sua proposta e puxar a brasa à sua sardinha, o CHEGA refere que países como a Dinamarca e França já proibiram a utilização do véu islâmico em espaços públicos e que, portanto, não aceita obrigar mulheres a andar na rua “como se fossem animais ou mercadoria”.
A verdade é que já deveríamos estar habituados a ignorar os comentários escandalosos do líder do CHEGA no parlamento. É como quando uma criança se chateia com os pais e manda aquelas boquinhas provocativas: ignora-se para não se dar mais força. Pelo menos, quando a minha mãe o fazia, resultava. André Ventura utilizou o exemplo das burcas exatamente por saber que iria ser controverso e, novamente, conseguiu o que queria.
Os meios de comunicação social colocaram, imediatamente, milhares de pessoas a debater sobre uma suposta lei que proíbe especificamente a utilização de burcas e niqabs em espaços públicos, oprimindo a religião islâmica e as mulheres. Assim, foi dada ao CHEGA tanta visibilidade quanto o partido deseja, porque afinal, bem ou mal, o que importa é ser falado.
Como o LIVRE argumentou, o CHEGA apresentou uma proposta “propositadamente mal construída” para causar todo este alarido. No entanto, como ressalvou o PSD, “o texto apresentado pode e deve ser aperfeiçoado em sede de especialidade”. Assim será feito, se o tribunal constitucional cumprir corretamente a sua função.
Esta proposta foi aprovada, não por ser uma afronta à realidade cultural de um grupo de pessoas, ao contrário do que André Ventura fez parecer no Parlamento, mas sim por uma questão de segurança.
O que mais me perturba é como a opinião pública, depois da aprovação desta lei, fez André Ventura sentir que, mais do que uma vitória da democracia, esta foi uma vitória para o seu partido.
Como disse Tânia Laranjo, às vezes o CHEGA “tropeça na razão”, e isso assusta as pessoas.
Neste momento, estão todos tão enfurecidos com o facto de este partido ter conseguido a homologação de uma das suas medidas que acabam por deixar de lado o pensamento mais racional.
Analisemos a situação de cabeça fria. Não é proibido andar de carapuço num banco? Ou andar de cara coberta em superfícies comerciais? A mim já me foi solicitado, por um segurança, que retirasse o boné num shopping.
Diz-se que esta medida ameaça os direitos das mulheres, mas quem é que nos assegura que, por baixo de uma burca ou niqab, está uma mulher muçulmana? Qualquer pessoa se pode aproveitar desse encobrimento para não ser identificado.
Além disso, uma boa comunicação é indispensável em qualquer sociedade para evitar, por exemplo, que informações importantes sejam mal transmitidas. E toda a gente sabe o quão difícil é comunicar com alguém sem poder olhar para o seu rosto.
Contudo, não me alongarei mais com opiniões acerca da utilização (ou não) da burca, uma vez que não é esse o ponto central deste artigo. Desejo apenas ressalvar que, apesar desta lei ter ainda algumas lacunas, vai ao encontro de uma das garantias fundamentais da democracia: a segurança pública.
É possível defender causas como os direitos das mulheres, liberdade individual e liberdade religiosa sem abdicar de pilares que asseguram a proteção de uma população e a paz social.
Este artigo de opinião é da pura responsabilidade do autor, não representando as posições do desacordo ou dos seus afiliados.
Fonte da imagem de capa: RTP Notícias
Escrito por: Alexandre Prazeres
Editado por: Maria Francisca Salgueiro


Deixe um comentário