Tomás Adrião, cantor e compositor, trouxe no seu primeiro álbum o reflexo de toda uma geração: “Perdoa se há em mim pressa para ser feliz” … a nossa geração, a dos vintes, vincada pelos vídeos de 30 segundos do TikTok que quer tudo para ontem. Quer acabar o curso, arranjar trabalho, sair de casa dos pais, encontrar o amor, viajar para todos os sítios e ir a todos os festivais. Mas entre nós e o Tomás há uma diferença: ele já percebeu que às vezes a pressa não nos leva pelo melhor caminho. Às vezes é a “calma” que nos leva mais longe.
Como surgiu a música na tua vida?
A música surgiu muito cedo. Eu comecei a estudar música em 2010. Após começar a estudar, desenvolvi o maior gosto, não só pela música clássica, mas pela criação da música. Eu sempre tive a necessidade de compor: lembro-me de tocar estudos que se estudam nos maiores graus do conservatório. Eu tentava pôr letra por cima, era algo que estava dentro de mim e sentia isso. E depois deixei o conservatório e comecei só dedicado à composição e à edição das minhas músicas.
A passagem pelo The Voice Kids
Tomás Adrião venceu o The Voice Kids em 2017, quando tinha 17 anos.
Eu tocava em bares e decidi ir para o The Voice para poder ter mais bares onde tocar. O The Voice, na minha cabeça, servia só para isso. Mas depois a ambição mudou um bocadinho e eu quis editar mesmo as minhas músicas. Acabei por perceber que havia pessoal a gostar e isso deu, obviamente, a um miúdo de 17 anos alguma confiança para que o resto acontecesse.
Eu sabia que ia compor em português, por isso fazia sentido cantar sempre em português. À exceção da primeira música, que era a minha banda preferida [The Beatles], achei que fazia sentido espelhar um bocado isso também. Mas depois decidi pegar em músicas antigas e modificá-las uma forma mais contemporânea, que era o meu gosto na altura. Acabou por não ser muito o que eu ia por compor, o que é engraçado, mas na altura estava naquela fase da vida em que só gostava de rock. Era aquela energia jovem que havia dentro de mim e surgiu dessa forma. Eu acho que se fosse hoje em dia fazia as músicas totalmente diferentes, só guitarra e voz.
O artista explica que na altura estava muito entusiasmado e que foi uma fase muito emocionante. Contudo, revela que essa emoção, esse “nervosinho” não deixou de aparecer.
Foi uma grande emoção na altura. E tem sido sempre, na verdade, eu acho que fico sempre aquele nervosinho antes de lançar qualquer coisa e acho que nunca mudou o sentimento, é sempre uma insegurança, que é, será que as pessoas vão gostar? Mas também sinto felicidade, por estar a lançar uma coisa que demorou muito tempo a ser feita e a ser pensada, o entusiasmo de tudo.
“Perdoa se há em mim pressa para ser feliz”
O primeiro álbum surge em 2021, com canções que passaram em novelas portuguesas. “É só mais um dia mau, mau, mau”? “Dia Mau”, uma música do Tomás.
Eu acho que vem da convivência que tenho com as pessoas minha idade, com amigos, comigo mesmo, nos meus pensamentos. Eu sinto que nós temos uma necessidade imensa de que tudo aconteça rápido e da melhor forma possível. E eu sentia isso porque eu tinha a tua idade [21 anos] quando lancei o primeiro álbum e estava nessa fase em que eu sentia que tinha de correr tudo bem, tinha de ser logo. E na verdade não era isso.
Passados esses quatro anos já refleti mais sobre esse assunto. Claro que a pressa ainda existe em mim, mas faz parte desta geração que é a geração TikTok, a geração Instagram, a geração que está tão perto, mas nunca está de uma forma real, é só uma ilusão. Nós temos sempre a sensação que há sempre pessoas melhores que nós, e nós não conseguimos chegar lá e vivemos sempre nesta frustração. E essa frustração, essa pressa, é muito saudável e eu escrevi muito sobre isso, e queria cantar sobre isso também. Era a pressa a viajar um futuro bom, profissionalmente, era a pressa de ser bem sucedido, era a pressa a encontrar alguém que me fizesse feliz, ou uma relação. São aqueles problemas de 20 anos que toda a gente tem.
Nas gerações dos meus pais isso não acontecia. Iam-se fazendo as coisas. Nós estamos sempre a pensar cinco anos à frente, dez anos à frente e parece que não vivemos o momento.
“Pré-ocupado” mas agora, com “Calma”
“Pré-Ocupado” é o mais recente trabalho do artista, um EP com quatro canções.
Estar pré-ocupado é não estar ainda ocupado com aquilo que está a acontecer. Preocupado é isso que quer dizer: quando estás preocupada, tu estás ocupada com uma coisa que ainda não está a acontecer. É um bocado aquela ansiedade… se estiveres pré-ocupado é complicado então convém estares só ocupado quando realmente o problema acontece.
Tu estás a estudar para um exame e estás preocupada pelo exame, porque ainda não chegou o exame e é meio complicado e se tu viveres assim com tudo o que te rodeia. Torna-se muito tóxico para ti mesmo. Todos nós sofremos um bocadinho disso e obviamente que eu também sinto.
“Calma” é a primeira canção do EP.
A “Calma” é um bocadinho a explicação para tudo isto. Quando estás sempre com pressa chegas a um alto nível e não consegues respirar e foi isso que eu senti. Tenho essa frase presente na música, “Com tanta pressa não soube respirar” e é verdade: quanto mais depressa vais menos resistência tens. Chega uma altura em que a corrida acaba e foi isso que eu senti, essa necessidade de ir com calma de pensar cada passo para não me cansar, para não me desgastar, para continuar a fazer aquilo que gosto e continuar a gostar daquilo que gosto. A certa altura queres tudo tão depressa, corres tudo tão depressa que começas a duvidar das tuas capacidades do que realmente gostas, do que realmente queres fazer.
Das “9 às 6”: como (sobre)viver da música em Portugal
À “Calma”, junta-se o “Contra a Maré”, o “Descompromisso”… e Inês Marques Lucas, que se juntou para o “9 às 6”.
Para mim, é um desabafo sobre aquilo que eu realmente vivo, que é uma rotina das 9 aos 6 como designer e depois tem a música um bocado como part-time. Eu acho que é possível fazer os dois e acredito que isso vai ser o meu rumo durante muito tempo. O meu objetivo não é só largar, não estou a usar uma coisa para fazer a outra. Eu estou a fazer os dois e gosto das duas coisas que faço. O que acontece é que não é fácil, acabas por ter menos tempo para ti e é desafiante, mas o desafio não me faz muita confusão.
No caso de Inês Marques Lucas, a perspetiva é diferente. A artista é só uma das muitas pessoas em Portugal que vive a realidade de ter outro trabalho, não por gosto, mas simplesmente por não ser possível viver da música como gostaria. Ou era. Recentemente, revelou nas suas redes sociais que se despediu do seu outro trabalho para se dedicar somente à música. A música, para ela, já não é “só” o seu “9 às 6”.
Viver da música em Portugal é mesmo muito difícil. Há um grupo de cinco, seis pessoas que passam todos os dias na rádio e há centenas de pessoas a fazerem música em Portugal,
Temos é de saber se gostamos realmente do que fazemos. É ir com calma, obviamente, arranjar soluções: se isto não está a dar desta forma, vou fazer de outra. São sempre bengalas que tu vais ter de encontrar ao longo da tua vida porque nem tudo às vezes é como tu achavas que ia ser. Eu aprendi isso e acho que isso também é crescer. Adaptas-te e adaptação é muito importante. Eu acho que como artista independente, que acabo por ser um em mais não sei quantos, é sempre difícil de conciliar o que ganhas da música para viver, e ainda investir na música, porque acaba sendo um investimento sempre muito grande. É difícil uma coisa só dar-te o suficiente para tu conseguires investir e ainda viver.
Vantagens de ser designer e músico: és dono e senhor da tua imagem!
A melhor forma de apoiar um artista independente é comprando a sua merch. Das t-shirts, aos CDS, das tote bags aos bonés. Até meias se encontram com alguma facilidade. Tomás Adrião desenhou a sua própria merch e também a sua “marca” visual, uma laranja. Desde que a utilizou no videoclipe de “Perdido”, nunca mais se quis despedir dela.
Desenhei a t-shirt e decidi lançá-la para suporte da música independente que faço hoje em dia. Muita gente adorou, que foi super bom. As pessoas identificaram-se com o tipo de desenho. É um desenho que está atual, então houve muita gente a comprar até por gosto. Uma vez fui para a Feira da Ladra a vender as t-shirts e imensos estrangeiros compraram a t-shirt. Obviamente não conhecem, depois eu expliquei mais ou menos a história, Também desenvolvi um lado quase de moda, nunca tinha feito nada assim e foi super interessante. Espero no futuro desenvolver mais peças, t-shirts, meias, sweatshirts, não sei, ainda não pensei muito a fundo sobre isso.
Podia ser qualquer outro fruto, só que por acaso foi a laranja num videoclipe [de “Perdido”], queria criar uma analogia sobre aquilo que queria ser e ainda não era e decidi que a laranja era aquilo que eu procurava. Portanto eu ia a uma frutaria, ia a uma festa e não encontrava a laranja depois percebi que a laranja estava no meu bolso.
Depois percebi que fazia sentido as laranjas aparecerem em todos os videoclipes, naquela altura porque era sempre aquela procura constante sobre aquilo que se calhar já somos. só que não percebemos e eu tinha isto bem presente. Usei a laranja como objeto para descrever isso e depois percebi que a laranja é um fruto que eu gosto e que queria continuar a ter nos meus videoclipes. Uso também como símbolo de comunicação, acho que até é um bom marketing na verdade.
Se quiseres apoiar um artista independente enquanto ganhas uma t-shirt bonita, já sabes!
Escrito por: Marta Ricardo
Editado por: José Pereira


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