The Tortured Poets Department, de Taylor Swift, é uma autópsia sentimental – um relatório emocional exaustivo, escrito por alguém que sobreviveu à colisão entre o amor e o desespero. É a voz de quem, com veias cheias de tinta preta, transforma ruínas em rascunhos e memórias em música.
Este álbum não é sobre amor. É sobre um estado alterado de consciência, uma insanidade temporária, uma fase maníaca partilhada com quem nunca chegou a ver mais do que a superfície (e nenhum deles viu). As suas canções surgem como entradas de um diário deixado em cima de uma secretária com marcas de chá e raiva – faixas que documentam não só o que foi vivido, mas também o que foi desfeito.
Cada música funciona como uma peça de evidência: há a ilusão de poder ser salva por alguém, há o trauma reencenado numa espécie de rom-com e há também a lucidez que chega tarde demais, quando já se gritou contra a parede. Mas ninguém a podia consertar – muito menos ela própria.
Há uma constante interrogação sobre quem ela é – para si própria, para os outros e para o mundo. A poeta assume diferentes personas ao longo do álbum: uma adolescente perdida, a mulher de voz profética ignorada, a figura pública comparada com ícones femininos e até uma observadora das vidas alheias. Esta fragmentação revela-nos uma crise de identidade alimentada por relações abusivas, pressões mediáticas e fama.

Fonte: Pinterest
Este álbum é sobre a tentativa desesperada de dar sentido àquilo que nunca fez sentido. As suas músicas caminham entre o sarcasmo como escudo e a raiva como consolo. O amor é visto como uma bomba-relógio, um tick, tick, tick constante, prestes a explodir. O resultado? Um coração em colapso total e uma poeta torturada que continua a escrever, porque é sobre os piores homens que escreve melhor.
As feridas não cicatrizadas da autora estão muito presentes ao longo do álbum. O luto amoroso, em vez de se resolver, parece crescer e apodrecer. Exploramos o fim das relações e o vazio que fica, mas, mais do que chorar, questionamos, analisamos, revivemos memórias – quase como se estivéssemos a construir o argumento final de um julgamento emocional.
O amor neste álbum raramente é doce – é instável, corrosivo, muitas vezes um vício mais do que uma escolha. As relações são descritas como fases maníacas mútuas, impulsivas e intensas, mas fadadas ao colapso. É-nos descrita essa ilusão de controlo e da tentativa frustrada de salvar quem não quer ser salvo. O amor também é performativo, sendo revelado um esforço constante de parecer bem, mesmo quando a autora está miserável.

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Há também uma crítica à forma como a vida da poeta é consumida, observada e reduzida a espetáculo. Há um cansaço na forma como ela é constantemente interpretada, como se vivesse num palco permanente. É-nos apresentado o desejo de fuga para um lugar onde possa desaparecer – ou recomeçar – longe da vigilância constante.
A cada verso, somos convidados a entrar nesse tribunal de sentimentos onde ela se apresenta como a Presidente do Departamento dos Poetas Torturados, colecionando musas como nódoas negras, erguendo bandeiras partidas como um escudo de guerra. O álbum ouve-se como um desabafo que recusa romantizar a dor, reivindicando a verdade nua e crua, havendo uma autoafirmação crescente no meio disso tudo. Ao longo da obra, a nossa poeta recupera a sua voz, mesmo que fragmentada, escrevendo, testemunhando e sobrevivendo.
Mas, mesmo assim, há beleza no colapso. Há poesia em desejar, falhar e continuar a tentar, seja a olhar pelas janelas dos outros, seja a construir manuscritos com os cacos do passado. A beleza, a poesia, o romance e o amor – essas são as coisas pelas quais nós vivemos.
Porque, no fim, The Tortured Poets Department é exatamente sobre isso: não sobre um romance, mas sobre resistir a tudo o que vem depois. Sobre sair da prisão para uma maré que nos engole, mas escrever até conseguir flutuar. Sobre transformar o tumulto emocional em arte.
All’s fair in love and poetry. Sincerely, The Chairman of The Tortured Poets Department.
Este artigo de opinião é da pura responsabilidade da autora, não representando as posições do desacordo ou dos seus afiliados.
Escrito por: Carolina Viana
Editado por: Pedro Cruz


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