Querido Evan Hansen, um musical interpessoal: entrevista a João Coelho e a Rui Melo

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No passado dia 5 de setembro tive a honra de assistir ao cativante e empático ensaio da peça “Querido Evan Hansen”.
“Querido Evan Hanson” é uma adaptação, realizada por Rui Melo, do musical “Dear Evan Hansen”, que teve a sua primeira apresentação em 2015 no Arena Stage em Washington DC.
A adaptação portuguesa estreou no teatro Maria Matos no passado dia 11 de setembro, variando os preços dos bilhetes entre os 20 e os 22 euros.

Imagem de, “Querido Evan Hansen” (Fonte: Força de Produção)

Este musical não nos conta somente a história de um jovem que sofre de ansiedade e depressão. Somos abraçados por todo o ecossistema que envolve Evan, pelas reações de diversos personagens de diferentes idades e estratos socioeconómicos a amarguras inevitáveis da vida como a depressão, luto e ansiedade. Esta história não nos procura dar respostas ao que é ou não batalhar contra doenças como a ansiedade e a depressão. Também não procura arranjar uma solução para o luto de alguém que nos seja, ou não, querido. Este musical coloca-nos a refletir sobre a nossa existência como seres interpessoais e não individuais, mostra-nos diferentes sujeitos a lidar com estas adversidades da vida da melhor forma que conseguem, mediante o momento e circunstâncias em que se encontram.

Fotografia de, “Querido Evan Hansen” (Fonte: Força de Produção)


Mesmo abordando temáticas sérias e, embora cada vez menos, tabu, o musical não se cinge a uma estória triste, é possível encontrar na peça diversos momentos humorísticos, acompanhados de músicas adaptadas por Rui Melo e interpretadas por talentosos artistas, como João Coelho, os quais tive o privilégio de entrevistar.

Fotografia de Joana Linda


Entrevista a Rui Melo, responsável pela encenação e adaptação do musical “Querido Evan Hansen”:


Esta é uma estória que atrai muitos jovens, foi um desafio criar uma peça para um público que, maioritariamente, tem um limiar de atenção tão curto?


Foi deliberado. Este espetáculo fala sobre muitas coisas, não fala somente sobre ansiedade, depressão e tentativas de suicídio na adolescência, fala também sobre as culpas na paternidade, que estão sempre presentes. Sendo pai identifico-me muito com o que é dito na primeira canção: se alguém tem um livro de instruções ou mapa. Coube-me desconstruir o que é a vida online, de forma simplificada como se fosse um contraste. Isto não é uma cura para nada, mas um reconhecimento de que a juventude está sem rumo, sem norte, a internet estimula ainda mais isso, esta versão simples na caligrafia, concessão do palco desenho de luz é precisamente para contrastar com o estilo que temos constantemente nas nossas mãos.

O Rui disse que é pai, com qual personagem mais aprendeu?


Com todos, este texto tem esse condão, qualquer uma das pessoas que esteja a assistir vai-se identificar com cada um dos personagens, com as coisas que diz, pela forma como as diz, pela forma como as sente. Por exemplo, o pai do Connor, é um pai incapaz de demonstrar amor, mas não quer dizer quer não o sinta. É só incapaz, tem os bloqueios, como temos todos, e eu duvido que haja alguém que nunca tenha passado por um processo de depressão ou ansiedade, quanto mais nesta fase das nossas vidas.

Entrevista a João Coelho, intérprete de Evan Hansen:


Qual é a música que melhor resume a peça?


A música quase do final, em que há a catarse, em que ele -Evan- desmorona e fala sobre toda a mentira, em como se sente, como se sentiu, fala da farsa que é.


Numa palavra como descreverias o teu personagem?


Medo, acho que medo.


Terias tomado a mesma decisão que Evan se estivesses no lugar dele?


Visto de fora diria que não, mas é muito difícil. Temos dois pais, cujo filho morreu, a dizer que só querem um pouco de esperança e de repente depositam-na toda em ti e obrigam-te quase a: não não, tu é que és, tu é que és a nossa esperança. Acho que isso é muito difícil e não consigo imaginar o que é a felicidade de duas pessoas que estão desmoronadas depender de ti. O que é que fazes? alinhas com eles e dás-lhes um pouco de esperança? ou depois a situação perde proporções? Diria que não, mas nunca estive na situação.

Fim da entrevista

Resta-me agradecer o convite e dar os parabéns a todos aqueles que tornaram este musical possível. Apelo também para uma das possíveis reflexões provenientes deste espetáculo: tal como tudo o que é criado pelo ser humano, a tecnologia é uma ferramenta cuja utilização pode ter, ou não, efeitos positivos nas nossas vidas, mediante o seu uso. Esta peça mostra-nos a funcionalidade destes instrumentos para conectar indivíduos, para nos humanizarmos e estimarmos mutuamente. Agora, mais do que nunca, temos a capacidade de ampliar a discussão da temática da saúde mental, de cuidarmos uns dos outros, de partilharmos experiências e abrirmos novas conversas e perspectivas.

Recursos de apoio à saúde mental:

Apoio Psicológico integrado na linha SNS24: 808 24 24 24 (24h por dia);

SOS Voz Amiga: 213 544 545 | 912 802 669 | 963 524 660, todos os dias das 16h00 às 24h00;

Projeto Descomplica (SNS): https://youtu.be/SIyv6438FCA?si=YJ1w7W4jsNQTYYTC.

Este artigo de opinião é da pura responsabilidade do autor, não representando as posições do desacordo ou dos seus afiliados

Escrito por: Sofia Isidoro.

Editado por: Marta Neves.

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